quinta-feira, 13 de julho de 2017

Todos temos o mesmo cérebro básico

Com quem estamos aqui? Que tipos de mentes povoam este mundo? São algumas das questões propostas por Carl Safina em Para lá das palavras – O que pensam e sentem os animais?
 
Os seres humanos consideram-se a bitola do mundo, que todas as coisas devem ser comparadas connosco. Mas, de facto, todas as faculdades que nos tornam humanos (e.g. empatia, comunicação, dor, fabrico de ferramentas) existem em diferentes graus entre outras mentes que partilham o mundo connosco.
 
Os animais dotados de coluna vertebral (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos) partilham basicamente o mesmo esqueleto, órgãos, sistemas nervoso e hormonal, bem como comportamentos.
 
Há o hábito de dizer “seres humanos e animais” como se a vida apenas encaixasse em duas categorias: nós e todos os outros; e continuamos a insistir, com insegurança, que os “animais” não são como nós, embora sejamos todos animais!
 
No que diz respeito à Consciência, pode-se dizer, de forma simplificada, que é a coisa que se sente como algo. Se um corte doer, somos conscientes. Essa parte de nós que sabe que o corte dói, que sente e pensa, é a nossa mente.
 
Por sua, vez a Senciência é a capacidade de sentir sensações. A Senciência dos seres humanos, dos elefantes, dos escaravelhos, das amêijoas, das alforrecas e das árvores varia numa escala móvel, desde a complexidade em pessoas até à aparente inexistência nas plantas.
 
A Cognição refere-se à capacidade de apreender e adquirir conhecimento e entendimento. O Pensamento é o processo através do qual se considera algo que foi apreendido. Como tudo o que tem de ver com os seres vivos, o pensamento também ocorre numa escala móvel de amplo espetro.
 
A Senciência, a Cognição e o Pensamento são processos que se sobrepõem nas mentes conscientes.
 
Será que os elefantes, os insetos ou qualquer outro animal poderão ser realmente conscientes sem o grande e enrugado córtex cerebral onde ocorre o pensamento humano? Por sinal, sim, até os seres humanos podem.
 
Roger perdeu cerca de 95% do seu córtex cerebral após uma infeção, não consegue recordar a década anterior à infeção, não consegue sentir sabor, nem cheiro, e tem grande dificuldade em formar novas memórias. No entanto, sabe quem é, reconhece-se num espelho e em fotografias, e apresenta um comportamento relativamente normal junto de outras pessoas, sendo capaz de fazer humor e sentir-se envergonhado. Tudo com um cérebro que não se assemelha a um cérebro humano.
 
Essa trivial noção humana de que só os seres humanos experimentam a consciência é retrógrada. 
 
Em 2012, os cientistas que estavam a redigir a Declaração de Cambrigde sobre a Consciência concluíram que todos os mamíferos e aves, bem como muitas outras criaturas, incluindo os polvos, possuem sistemas nervosos capazes de consciência (os polvos usam ferramentas e resolvem problemas com a mesma destreza que a maioria dos símios). A ciência está a confirmar o óbvio: os outros animais ouvem, veem e cheiram com os seus ouvidos, olhos e narizes; assustam-se quando encontram motivos para ter medo e sentem-se felizes quando parecem felizes. 
 
“O que quer que seja a consciência (…) os cães, os pássaros e um abundante número de outras espécies possuem-na. (…) Também eles experimentam a vida.” – Christof Koch.
 
“O principal motivo para estar aqui com minudências é aperceber-me de que, comparando com a estranheza das plantas e as tremendas diferenças entre plantas e animais, uma elefanta a cuidar da sua cria é algo tão próximo de nós que ela podia muito bem ser minha irmã.” – Carl Safina. 
 
Fonte: Safina, Carl (2016), Para lá das Palavras – O que pensam e sentem os animais, Lisboa, Relógio d’Água Editores.
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